Este é um espaço de divulgação, discussão e reflexão acerca dos mais variados e distintos textos, verbais ou não. Afinal, a literatura e a língua estão expressas sob diversas formas, que nos conduzem ao conhecimento, inclusive de nós mesmos. Bem vindo!

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Rosa de Hiroshima

Acho esta canção linda. Foi composta pelo  nosso Camões brasileiro, Vinícius de Moares, e musicada por Ney Matogrosso. É claro que a mensagem é signicativa, mas o Ney consegue dar o tom que o texto pede para alcançar o seu nível reflexivo, através da melodia utilizada.
Este contexto histórico de guerra e conflitos, vai influir diretamente na formação da segunda geração modernista no Brasil, no qual os poetas, como Carlos Drummond de Andrade, vão falar sobre a necessidade de se exaltar o amor, em detrimento do cenário de tristeza advindo da ditadura militar de Getúlio Vargas, no Brasil, e principalmente, da ascensão da Segunda Guerra Mundial, quando Alemanha invade a Polônia, em 1939.  

Fábula eleitoral para crianças

"Um dia, meninos, as coisas da natureza quiseram eleger o rei ou a rainha do universo. Os três reinos entraram logo a confabular. Animais, vegetais e minerais começaram a viver uma vida agitada de surtos eloqüentes, manobras, recados furtivos, mensagens cifradas, promessas mirabolantes, ardis, intrigas, palpites, conversinhas ao pé do ouvido.
Entre os bichos era um tumulto formidável. Bandos de periquitos saíam em caravana eleitoral, matilhas de cães discursavam dentro da noite, cáfilas de camelos percorriam os desertos, formigas realizavam comícios fantásticos, a rainha das abelhas passava com o seu séquito, sem falar nos cardumes de peixes, nos lobos em alcatéias pelos montes, nas manadas de búfalos pelas savanas, nas revoadas instantâneas dos pombos-correios.
Todas as qualidades eram postas à prova: a astúcia da raposa, a agilidade dos felinos, o engenho dos cupins, o siso da coruja, o poder de intriga das serpentes, a picardia do zorro, a doçura da pomba, a teimosia do burro, o cosmopolitismo dos ratos...
O leão, o tigre, a pantera, o leopardo e outros queriam derramar muito sangue; os pássaros coloridos faziam frente única para indicar um pássaro colorido; já os pássaros que cantam decidiam apontar como candidato o rouxinol, a cotovia, a patativa: as cegonhas, irresolutas, passavam as tardes pensando; os patos selvagens desfilavam no céu; as andorinhas, tímidas, buscavam o refúgio das igrejas; e a águia, fascista de nascença, pretendia organizar lá no alto uma conferência de que só participassem as aves de rapina, como o falcão, o condor e o gavião-de-penacho.
Os papagaios viviam a arengar bobagens pelas árvores; a raposa corria as várzeas articulando uma candidatura, ninguém sabia qual; os macacos eram vaiados quando alegavam a semelhança com o homem; o cavalo se insinuou candidato, dando a sua condição de antigo senador; o pavão, escondendo os pés, exibia a cauda; nos brejos, os sapos repetiam slogans monótonos; os jacarés e as tartarugas ressonavam na beira dos rios, que passavam levando sussuros quase imperceptíveis, a conversar as pedras e as ervas das margens; o rato do campo ia de vez em quando se aconselhar com o rato da cidade; os gansos citavam velhos costumes romanos; certos bichos, como o boi e a íbis, invocavam direitos divinos, que não eram mais levados a sério; as hienas e os chacais opinavam por um conselho de notáveis, a ser constituído pelos animais ferozes, que lhes deixavam os restos; até a ameba, coitada, queria ser candidata, dizendo-se a origem da vida.
A mosca azul voava e revoava por todos os cantos. Quem será o rei ou a rainha do universo? De dia, as borboletas andavam como doidas pelos campos, à noite, os vaga-lumes acendiam as suas luzes.
Nas profundezas da terra, o carbono fazia estranhas combinações com o hidrogênio. O diamante e o ouro reluziam de esperança. As estrelas pretendiam uma coalizão de todo o espaço constelado em torno de Vênus, causando ciúmes à Lua.
As flores distribuíam perfumes. Árvores agitadas recebiam recados que os ventos traziam de longe. A floresta pensava eleger não um rei, mas um colegiado de carvalhos, velhos, cheios de experiência. E por toda a flora era um germinar, um brotar, um verdejar, um florescer. Os monocotiledôneos discordavam dos dicotiledôneos, os fanerógamos acusavam de hipocrisia os criptógamos. A plena campanha eleitoral com todos os incidentes. Só os ciprestes continuavam fechados em sua indiferença.
A despeito dos interesses em choque, e de tantas contradições, é preciso dizer, a bem da verdade, que o pleito transcorreu com a máxima lisura.
Ao fim de tudo, a escolha não podia ter sido mais feliz, pois os três reinos unidos elegeram a rosa rainha suprema do universo.
Sim, a rosa, a rosa na sua simplicidade tocada de esplendor, presa na sua haste entre o céu e a terra, eterna e efêmera, a rosa, carne, espírito e pó. 
E, para entronizar a rainha, o dia se iluminou com a sua luz mais clara, o mar se fez manso, os pássaros cantaram com inspiração, as árvores se puseram mais verdes e mais altas, as flores vestiram roupagens de gala, os seixos rolaram alegremente nas praias, os juncos das lagoas se inclinaram com reverência, as nuvens se desfraldaram como cortinas de gaze sobre o berilo. No fundo do mar era uma alegria silenciosa e solene como um Te Deum em uma catedral verde-escuro, os polvos gesticulando em câmara-lenta, os peixes e as medusas passando sem barulho.
Entre os seres humanos, só as crianças sabiam que era o dia da entronização da rosa, e nada contaram a ninguém. Nem o poeta se lembrava de que a rosa era a rainha, a rosa que se achava expectante no seu recato soberano, quando passou pelo jardim um homem feio e preocupado. Era um candidato a qualquer coisa, a vereador, a deputado, a prefeito, a presidente, não se sabe ao certo. Distraído nas suas ambições, ele colheu a rainha do universo, que entrou logo a fenecer em dedos úmidos. Depois, ele olhou e viu que se tratava de uma rosa, uma rosa a morrer. Mal-me-quer, bem-me-quer, mal-me-quer... 
O homem começou a desfolhar a rosa só para saber se dessa vez seria eleito. E a rosa morreu. 
Foi por isso que o dia se fechou de repente, os animais uivaram nos bosques, as aves sumiram, o vento se desatou sobre o mar enraivecido, o raio e o trovão tomaram conta da noite sem estrelas,. Entre os humanos, só as crianças na hora do jantar perderam a fome. Estava morta a rainha do universo.
Mas nas trevas, insistente, nasceu de novo a rosa e iluminou o paraíso perdido."

Paulo Mendes Campos

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Onde estou? Este sítio desconheço

Onde estou? Este sítio desconheço:
Quem fez tão diferente aquele prado?
Tudo outra natureza tem tomado;
E em contemplá-lo tímido esmoreço.

Uma fonte aqui houve; eu não me esqueço

De estar a ela um dia reclinado:
Ali em vale um monte está mudado:
Quanto pode dos anos o progresso!

Árvores aqui vi tão florescentes,

Que faziam perpétua a primavera:
Nem troncos vejo agora decadentes.

Eu me engano: a região esta não era:

Mas que venho a estranhar, se estão presentes
Meus males, com que tudo degenera! 

Cláudio Manuel da Costa

domingo, 26 de junho de 2011

Desejo...

Satânico é meu pensamento a teu respeito, e ardente é o meu desejo de apertar-te em minha mão, numa sede de vingança incontestável pelo que me fizeste ontem. A noite era quente e calma, e eu estava em minha cama, quando, sorrateiramente, te aproximaste. Encostaste o teu corpo sem roupa no meu corpo nu, sem o mínimo pudor! Percebendo minha aparente indiferença,aconchegaste-te a mim e mordeste-me sem escrúpulos.
Até nos mais íntimos lugares. Eu adormeci.
Hoje quando acordei, procurei-te numa ânsia ardente, mas em vão.
Deixaste em meu corpo e no lençol provas irrefutáveis do que entre nós ocorreu durante a noite.
Esta noite recolho-me mais cedo, para na mesma cama, te esperar. Quando chegares, quero te agarrar com avidez e força. Quero te apertar com todas as forças de minhas mãos. Só descansarei quando vir sair o sangue quente do seu corpo.
Só assim, livrar-me-ei de ti, pernilongo Filho da Puta!!!!

Carlos Drummond de Andrade 

Desencontros

 Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Carlos Drummond de Andrade

São os desencontros da vida... Às vezes nos deixam tristes por não termos a pessoa de quem mais gostamos ao nosso lado, outrora, nos surpreende com um amor totalmente inesperado. Por isso, temos o direito de ficarmos tristes em alguns momentos, mas há também o dever de não nos comprazermos no sofrimento.  
Enquanto estivermos vivos, vamos à luta...

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Tendências Comportamentais na Literatura

O Cortiço foi o melhor livro que li em toda a minha vida. A referida obra marcou-me de tal forma, que fiz monografia sobre ele, e mudei completamente o meu ramo de pesquisa, que até então era a Línguística e o Português.  Há, uma curiosidade que nunca revelei a ninguém e vou contar agora. 
O que mais impressionou-me nesta obra naturalista, foi a visão sexual mostrada pela mesma. Tanto nos casais heterossexuais: a tríade Jerônimo, Rita Baiana e Piedade, Bertoleza e João Romão; como também na relação homossexual entre Léonie e Pombinha. 
Acredito que essa visão promíscua da vida sempre me fascinou, as taras, a ambição, esse desejo de enriquecer, a podridão. Mas o que me atrai não é bem estes fatos, mas a investigação de suas origens, suas raízes e causas. Busco nos filmes assistidos por mim na atualidade, principalmente os referentes às favelas e à criminalidade, as relações existentes entre o ontem e o hoje no que concerne à origem da miséria. Isso é o real, aquilo que muitos tentam esconder por meio de idealizações e fantasias que nos fazem ou ainda nos farão sofrer se não encararmos o mundo de frente. Esta tese foi o mote para o surgimento do Realismo, na França, com Madame Bovary, de Flaubert, e posteriormente, o Naturalismo com Émile Zola, ambos no século XIX.   
Vejamos algumas diferenciações básicas entre Realismo e Naturalismo. Lembrando que estes são trechos do meu TCC, portanto, quem copiar, por gentileza coloque os créditos.
Realista é um termo derivante de real, oriundo do adjetivo do baixo latim realis, reali, derivante de res, cujo significado é coisa, fato. Assim, Real+ ismo é uma palavra “indicadora da preferência pelos fatos e a tendência a encarar os fatos tais como na realidade são”. Ressaltando que “ismo” é um sufixo denotativo de partido, seita, crença, gênero ou escola.
Portanto, o Realismo é a escola literária do século XIX na qual se dará ênfase à realidade, mostrando os seus aspectos sórdidos, que até então eram camuflados pela subjetividade do período anterior.
A referida palavra abarca para a literatura em 1857, pelas mãos de Champfleury ao publicar ensaios a partir de 1843, expondo nestes a doutrina realista. Porém, a publicação de Madame Bovary de Flaubert, em 1857, faz o Realismo triunfar na França.
O Naturalismo caracteriza-se como uma tendência dentro da literatura realista, pois busca-se retratar uma verdade que necessita ser provada por meio dos estudos científicos e filosóficos, atendendo a uma demanda do contexto vigente da época, na qual figuravam as descobertas científicas, no intuito de analisar e provar os desígnios comportamentais do homem sob os influxos biológico, psicológico ou do meio.
Por isso, os romances naturalistas são "de tese", pois os comportamentos descritos precisam ser comprovados pelo estudo de análise científica. O Realismo, entretanto, coloca em pauta comportamentos comprovados, como o adultério e as relações movidas pelo interesse. O curioso é que isto estava em pauta há duzentos anos, e algumas coisas não se modificaram. Ainda há certos comportamentos denunciados naquela época, que prevalecem hoje. Assim, podemos afirmar que a literatura da época cumpriu o seu papel, de denúncia do incorreto para tentar melhorá-lo. Mas, algumas pessoas não cumpriram o delas. A realidade continua sendo muito triste...

Esteriótipos...

Queria postar um texto sobre um homem selvagem, aquele que deixa qualquer mulher enlouquecida pelo desejo de tê-lo, ao menos por um dia. 
Entretanto, descobri esta crônica do Arnaldo Jabor sobre a coisificação da mulher midiática, aquela tida como gostosa pelos marmanjos, e que consegue a proeza de despertar nos homens o instinto sexual que estes julgam ter pelo desconhecido. A crítica do texto, como vocês verão, reside exatamente aí: Elas conseguiriam no máximo, ser a amante, e mesmo assim, tenho dúvidas, pois o homem de verdade, aquele que as quer para cúmplice, mulher, mãe... protetora e defensora da família que deseja construir, com o tempo, certamente enjoará desta postura vertical e única destas mulheres fabricadas, de só servir na cama. Pois o relacionamento exige mais do que sexo.  
Espero que gostem...   

Mulheres
Outro dia, a Adriane Galisteu deu uma entrevista dizendo que os homens não querem namorar as mulheres que são símbolos sexuais. É isto mesmo.
Quem ousa namorar a Feiticeira ou a Tiazinha?
As mulheres não são mais para amar; nem para casar. São para 'ver'.
Que nos prometem elas, com suas formas perfeitas por anabolizantes e silicones?
Prometem-nos um prazer impossível, um orgasmo metafísico, para o qual os homens não estão preparados...
As mulheres dançam frenéticas na TV, com bundas cada vez mais malhadas, com seios imensos, girando em cima de garrafas, enquanto os pênis-espectadores se sentem apavorados e murchos diante de tanta gostosura.
Os machos estão com medo das 'mulheres-liquidificador'.
O modelo da mulher de hoje, que nossas filhas ou irmãs almejam ser (meu Deus!), é a prostituta transcendental, a mulher-robô, a 'Valentina', a 'Barbarela', a máquina-de-prazer sem alma, turbinas de amor com um hiperatômico tesão.
Que parceiros estão sendo criados para estas pós-mulheres? Não os há.
Os 'malhados', os 'turbinados' geralmente são bofes-gay, filhos do mesmo narcisismo de mercado que as criou.
Ou, então, reprodutores como o Zafir, para o Robô-Xuxa.
A atual 'revolução da vulgaridade', regada a pagode, parece 'libertar' as mulheres.
Ilusão à toa.
A 'libertação da mulher' numa sociedade escravista como a nossa deu nisso: Superobjetos. Se achando livres, mas aprisionadas numa exterioridade corporal que apenas esconde pobres meninas famintas de amor, carinho e dinheiro.
São escravas aparentemente alforriadas numa grande senzala sem grades.
Mas, diante delas, o homem normal tem medo.
Elas são 'areia demais para qualquer caminhãozinho'.
Por outro lado, o sistema que as criou enfraquece os homens.
Eles vivem nervosos e fragilizados com seus pintinhos trêmulos, decadentes, a meia-bomba, ejaculando precocemente, puxando sacos, lambendo botas, engolindo sapos, sem o antigo charme 'jamesbondiano' dos anos 60.
Não há mais o grande 'conquistador'.
Temos apenas os 'fazendeiros de bundas' como o Huck, enquanto a maioria virou uma multidão de voyeur, babando por deusas impossíveis.
Ah, que saudades dos tempos das bundinhas e peitinhos 'normais' e 'disponíveis'...
Pois bem, com certeza a televisão tem criado 'sonhos de consumo' descritos tão bem pela língua ferrenha do Jabor (eu).
Mas ainda existem mulheres de verdade.
Mulheres que sabem se valorizar e valorizar o que tem 'dentro de casa', o seu trabalho.
E, acima de tudo, mulheres com quem se possa discutir um gosto pela música, pela cultura, pela família, sem medo de parecer um 'chato' ou um 'cara metido a intelectual'.
Mulheres que sabem valorizar uma simples atitude, rara nos homens de hoje, como abrir a porta do carro para elas.
Mulheres que adoram receber cartas, bilhetinhos (ou e-mails) românticos!!
Escutar no som do carro, aquela fitinha velha dos Beegees ou um cd do Kenny G (parece meio breguinha)...mas é tão boooom namorar escutando estas musiquinhas tranquilas!!!
Penso que hoje, num encontro de um 'Turbinado' com uma 'Saradona' o papo deve ser do tipo:
-'meu'... o meu professor falou que posso disputar o Iron Man que vou ganhar fácil!.'
-'Ah 'meu'..o meu personal Trainner disse que estou com os glúteos bem em forma e que nunca vou precisar de plástica'. E a música???
Só se for o 'último sucesso (????)' dos Travessos ou 'Chama-chuva...' e o 'Vai serginho'???...
Mulheres do meu Brasil Varonil!!! Não deixem que criem estereótipos!!
Não comprem o cinto de modelar da Feiticeira. A mulher brasileira é linda por natureza!!
Curta seu corpo de acordo com sua idade, silicone é coisa de americana que não possui a felicidade de ter um corpo esculpido por Deus e bonito por natureza. E se os seus namorados e maridos pedirem para vocês 'malharem' e ficarem iguais à Feiticeira, fiquem... igual a feiticeira dos seriados de Tv: - Façam-os sumirem da sua vida!!!

Arnaldo Jabor

domingo, 19 de junho de 2011

Venha ver o pôr do Sol

Um dos contos mais lindos que conheci... 
 
 Ela subiu sem pressa a tortuosa ladeira. À medida que avançava, as casas iam rareando, modestas casas espalhadas sem simetria e ilhadas em terrenos baldios. No meio da rua sem calçamento, coberta aqui e ali por um mato rasteiro, algumas crianças brincavam de roda. A débil cantiga infantil era a única nota viva na quietude da tarde.
Ele a esperava encostado a uma árvore. Esguio e magro, metido num largo blusão azul-marinho, cabelos crescidos e desalinhados, tinham um jeito jovial de estudante.
-Minha querida Raquel.
Ela encarou-o, séria. E olhou para os próprios sapatos.
-Vejam que lama. Só mesmo você inventaria um encontro num lugar destes. Que idéia, Ricardo, que idéia! Tive que descer do taxi lá longe, jamais ele chegaria aqui em cima.
Ele sorriu entre malicioso e ingênuo.
- Jamais, não é? Pensei que viesse vestida esportivamente e agora me aparece nessa elegância...Quando você andava comigo, usava uns sapatões de sete-léguas, lembra?
-Foi para falar sobre isso que você me fez subir até aqui? - perguntou ela, guardando as luvas na bolsa. Tirou um cigarro.
-Hem?!- Ah, Raquel... - e ele tomou-a pelo braço rindo.
- Você está uma coisa de linda. E fuma agora uns cigarrinhos pilantras, azul e dourado...Juro que eu tinha que ver uma vez toda essa beleza, sentir esse perfume. Então fiz mal? 
- Podia ter escolhido um outro lugar, não? – Abrandara a voz – E que é isso aí? Um cemitério? Ele voltou-se para o velho muro arruinado. Indicou com o olhar o portão de ferro, carcomido pela ferrugem.
- Cemitério abandonado, meu anjo. Vivos e mortos, desertaram todos. Nem os fantasmas sobraram, olha aí como as criancinhas brincam sem medo – acrescentou, lançando um olhar às crianças rodando na sua ciranda. Ela tragou lentamente. Soprou a fumaça na cara do companheiro. Sorriu. - Ricardo e suas idéias. E agora? Qual é o programa? Brandamente ele a tomou pela cintura.- Conheço bem tudo isso, minha gente está enterrada aí. Vamos entrar um instante e te mostrarei o pôr do sol mais lindo do mundo. Perplexa, ela encarou-o um instante. E vergou a cabeça para trás numa risada.
-Ver o pôr do sol!...Ah, meu Deus...Fabuloso, fabuloso!...Me implora um último encontro, me atormenta dias seguidos, me faz vir de longe para esta buraqueira, só mais uma vez, só mais uma! E para quê? Para ver o pôr do sol num cemitério... Ele riu também, afetando encabulamento como um menino pilhado em falta.
- Raquel minha querida, não faça assim comigo. Você sabe que eu gostaria era de te levar ao meu apartamento, mas fiquei mais pobre ainda, como se isso fosse possível. Moro agora numa pensão horrenda, a dona é uma Medusa que vive espiando pelo buraco da fechadura...
-E você acha que eu iria?
-Não se zangue, sei que não iria, você está sendo fidelíssima. Então pensei, se pudéssemos conversar um instante numa rua afastada...- disse ele, aproximando-se mais. Acariciou-lhe o braço com as pontas dos dedos. Ficou sério. E aos poucos, inúmeras rugazinhas foram se formando em redor dos seus olhos ligeiramente apertados. Os leques de rugas se aprofundaram numa expressão astuta. Não era nesse instante tão jovem como aparentava. Mas logo sorriu e a rede de rugas desapareceu sem deixar vestígio. Voltou-lhe novamente o ar inexperiente e meio desatento 
–Você fez bem em vir.- Quer dizer que o programa... E não podíamos tomar alguma coisa num bar?
- Estou sem dinheiro, meu anjo, vê se entende.- Mas eu pago.- Com o dinheiro dele? Prefiro beber formicida. Escolhi este passeio porque é de graça e muito decente, não pode haver passeio mais decente, não concorda comigo? Até romântico. 
Ela olhou em redor. Puxou o braço que ele apertava.- Foi um risco enorme Ricardo. Ele é ciumentíssimo. Está farto de saber que tive meus casos. Se nos pilha juntos, então sim, quero ver se alguma das suas fabulosas idéias vai me consertar a vida.
-Mas me lembrei deste lugar justamente porque não quero que você se arrisque, meu anjo. Não tem lugar mais discreto do que um cemitério abandonado, veja, completamente abandonado – prosseguiu ele, abrindo o portão. Os velhos gonzos gemeram. 
– Jamais seu amigo ou um amigo do seu amigo saberá que estivemos aqui.- É um risco enorme, já disse . Não insista nessas brincadeiras, por favor. E se vem um enterro? Não suporto enterros.- Mas enterro de quem? Raquel, Raquel, quantas vezes preciso repetir a mesma coisa?! Há séculos ninguém mais é enterrado aqui, acho que nem os ossos sobraram, que bobagem. Vem comigo, pode me dar o braço, não tenha medo...O mato rasteiro dominava tudo. E, não satisfeito de ter se alastrado furioso pelos canteiros, subira pelas sepulturas, infiltrando-se ávido pelos rachões dos mármores, invadira alamedas de pedregulhos esverdinhados, como se quisesse com a sua violenta força de vida cobrir para sempre os últimos vestígios da morte. Foram andando vagarosamente pela longa alameda banhada de sol. Os passos de ambos ressoavam sonoros como uma estranha música feita do som das folhas secas trituradas sobre os pedregulhos. Amuada mas obediente, ela se deixava conduzir como uma criança. Às vezes mostrava certa curiosidade por uma ou outra sepultura com os pálidos medalhões de retratos esmaltados.
- É imenso, hem? E tão miserável, nunca vi um cemitério mais miserável, é deprimente – exclamou ela atirando a ponta do cigarro na direção de um anjinho de cabeça decepada.- Vamos embora, Ricardo, chega.
- Ah, Raquel, olha um pouco para esta tarde! Deprimente por quê? Não sei onde foi que eu li, a beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da tarde, está no crepúsculo, nesse meio-tom, nessa ambigüidade. Estou lhe dando um crepúsculo numa bandeja e você se queixa.
- Não gosto de cemitério, já disse. E ainda mais cemitério pobre. Delicadamente ele beijou-lhe a mão.- Você prometeu dar um fim de tarde a este seu escravo.
-É, mas fiz mal. Pode ser muito engraçado, mas não quero me arriscar mais.
-Ele é tão rico assim?
-Riquíssimo. Vai me levar agora numa viagem fabulosa até o Oriente. Já ouviu falar no Oriente? Vamos até o Oriente, meu caro...Ele apanhou um pedregulho e fechou-o na mão. A pequenina rede de rugas voltou a se estender em redor dos seus olhos. A fisionomia, tão aberta e lisa, repentinamente escureceu, envelhecida. Mas logo o sorriso reapareceu e as rugazinhas sumiram.
- Eu também te levei um dia para passear de barco, lembra?Recostando a cabeça no ombro do homem, ela retardou o passo.
- Sabe Ricardo, acho que você é mesmo tantã...Mas, apesar de tudo, tenho às vezes saudade daquele tempo. Que ano aquele! Palavra que, quando penso, não entendo até hoje como agüentei tanto, imagine um ano.
- É que você tinha lido A dama das Camélias, ficou assim toda frágil, toda sentimental. E agora? Que romance você está lendo agora. Hem?
- Nenhum - respondeu ela, franzindo os lábios. Deteve-se para ler a inscrição de uma laje despedaçada: - A minha querida esposa, eternas saudades - leu em voz baixa. Fez um muxoxo.- Pois sim. Durou pouco essa eternidade. Ele atirou o pedregulho num canteiro ressequido. Mas é esse abandono na morte que faz o encanto disto. Não se encontra mais a menor intervenção dos vivos, a estúpida intervenção dos vivos. Veja- disse, apontando uma sepultura fendida, a erva daninha brotando insólita de dentro da fenda -, o musgo já cobriu o nome na pedra. Por cima do musgo, ainda virão as raízes, depois as folhas... Esta a morte perfeita, nem lembrança, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso. Ela aconchegou-se mais a ele. Bocejou.
- Está bem, mas agora vamos embora que já me diverti muito, faz tempo que não me divirto tanto, só mesmo um cara como você podia me fazer divertir assim – Deu-lhe um rápido beijo na face. 
- Chega Ricardo, quero ir embora.- Mais alguns passos...- Mas este cemitério não acaba mais, já andamos quilômetros! – Olhou para atrás. – Nunca andei tanto, Ricardo, vou ficar exausta.
-A boa vida te deixou preguiçosa. Que feio – lamentou ele, impelindo-a para frente. – Dobrando esta alameda, fica o jazigo da minha gente, é de lá que se vê o pôr do sol. – E, tomando-a pela cintura: - Sabe, Raquel, andei muitas vezes por aqui de mãos dadas com minha prima. Tínhamos então doze anos. Todos os domingos minha mãe vinha trazer flores e arrumar nossa capelinha onde já estava enterrado meu pai. Eu e minha priminha vínhamos com ela e ficávamos por aí, de mãos dadas, fazendo tantos planos. Agora as duas estão mortas.
- Sua prima também?
- Também. Morreu quando completou quinze anos. Não era propriamente bonita, mas tinha uns olhos...Eram assim verdes como os seus, parecidos com os seus. Extraordinário, Raquel, extraordinário como vocês duas...Penso agora que toda a beleza dela residia apenas nos olhos, assim meio oblíquos, como os seus.
- Vocês se amaram?
- Ela me amou. Foi a única criatura que... - Fez um gesto. – Enfim não tem importância. 
Raquel tirou-lhe o cigarro, tragou e depois devolveu-o - Eu gostei de você, Ricardo.- E eu te amei. E te amo ainda. Percebe agora a diferença? Um pássaro rompeu o cipreste e soltou um grito. Ela estremeceu.- Esfriou, não? Vamos embora.
- Já chegamos, meu anjo. Aqui estão meus mortos. 
Pararam diante de uma capelinha coberta de alto a baixo por uma trepadeira selvagem, que a envolvia num furioso abraço de cipós e folhas. A estreita porta rangeu quando ele a abriu de par em par. A luz invadiu um cubículo de paredes enegrecidas, cheias de estrias de antigas goteiras. No centro do cubículo, um altar meio desmantelado, coberto por uma toalha que adquirira a cor do tempo. Dois vasos de desbotada opalina ladeavam um tosco crucifixo de madeira. Entre os braços da cruz, uma aranha tecera dois triângulos de teias já rompidas, pendendo como farrapos de um manto que alguém colocara sobre os ombro do Cristo. Na parede lateral, à direita da porta, uma portinhola de ferro dando acesso para uma escada de pedra, descendo em caracol para a catacumba.Ela entrou na ponta dos pés, evitando roçar mesmo de leve naqueles restos da capelinha.
-Que triste é isto, Ricardo. Nunca mais você esteve aqui? 
Ele tocou na face da imagem recoberta de poeira. Sorriu melancólico.
-Sei que você gostaria de encontrar tudo limpinho, flores nos vasos, velas, sinais da minha dedicação, certo? - Mas já disse que o que eu mais amo neste cemitério é precisamente esse abandono, esta solidão. As pontes com o outro mundo foram cortadas e aqui a morte se isolou total. Absoluta.
Ela adiantou-se e espiou através das enferrujadas barras de ferro da portinhola. Na semi-obscuridade do subsolo, os gavetões se estendiam ao longo das quatro paredes que formavam um estreito retângulo cinzento.
- E lá embaixo? 
- Pois lá estão as gavetas. E, nas gavetas, minhas raízes. Pó, meu anjo, pó- murmurou ele. Abriu a portinhola e desceu a escada. Aproximou-se de uma gaveta no centro da parede, segurando firme na alça de bronze, como se fosse puxá-la. – A cômoda de pedra. Não é grandiosa? Detendo-se no topo da escada, ela inclinou-se mais para ver melhor.
-Todas estas gavetas estão cheias? - Cheias?...- Sorriu.- Só as que tem o retrato e a inscrição, está vendo? Nesta está o retrato da minha mãe, aqui ficou minha mãe- prosseguiu ele, tocando com as pontas dos dedos num medalhão esmaltado, embutido no centro da gaveta. Ela cruzou os braços. Falou baixinho, um ligeiro tremor na voz.
-Vamos, Ricardo, vamos.
- Você está com medo?
- Claro que não, estou é com frio. Suba e vamos embora, estou com frio! Ele não respondeu. Adiantara-se até um dos gavetões na parede oposta e acendeu um fósforo. Inclinou-se para o medalhão frouxamente iluminado:- A priminha Maria Emília. Lembro-me até do dia em que tirou esse retrato. Foi umas duas semanas antes de morrer... Prendeu os cabelos com uma fita azul e vejo-a se exibir, estou bonita? Estou bonita?...- Falava agora consigo mesmo, doce e gravemente.- Não, não é que fosse bonita, mas os olhos...Venha ver, Raquel, é impressionante como tinha olhos iguais aos seus. Ela desceu a escada, encolhendo-se para não esbarrar em nada.
- Que frio que faz aqui. E que escuro, não estou enxergando... Acendendo outro fósforo, ele ofereceu-o à companheira.
- Pegue, dá para ver muito bem... - Afastou-se para o lado.- Repare nos olhos.- Mas estão tão desbotados, mal se vê que é uma moça...- Antes da chama se apagar, aproximou-a da inscrição feita na pedra. Leu em voz alta, lentamente. - Maria Emília, nascida em vinte de maio de mil oitocentos e falecida... - Deixou cair o palito e ficou um instante imóvel – Mas esta não podia ser sua namorada, morreu há mais de cem anos! Seu menti...Um baque metálico decepou-lhe a palavra pelo meio. Olhou em redor. A peça estava deserta. Voltou o olhar para a escada. No topo, Ricardo a observava por detrás da portinhola fechada. Tinha seu sorriso meio inocente, meio malicioso.- Isto nunca foi o jazigo da sua família, seu mentiroso? Brincadeira mais cretina! – exclamou ela, subindo rapidamente a escada. – Não tem graça nenhuma, ouviu? 
Ele esperou que ela chegasse quase a tocar o trinco da portinhola de ferro. Então deu uma volta à chave, arrancou-a da fechadura e saltou para trás.- Ricardo, abre isto imediatamente! Vamos, imediatamente! – ordenou, torcendo o trinco.- Detesto esse tipo de brincadeira, você sabe disso. Seu idiota! É no que dá seguir a cabeça de um idiota desses. Brincadeira mais estúpida!- Uma réstia de sol vai entrar pela frincha da porta, tem uma frincha na porta. Depois, vai se afastando devagarinho, bem devagarinho. Você terá o pôr do sol mais belo do mundo. Ela sacudia a portinhola.
- Ricardo, chega, já disse! Chega! Abre imediatamente, imediatamente! - Sacudiu a portinhola com mais força ainda, agarrou-se a ela, dependurando-se por entre as grades. Ficou ofegante, os olhos cheios de lágrimas. Ensaiou um sorriso. 
- Ouça, meu bem, foi engraçadíssimo, mas agora preciso ir mesmo, vamos, abra... Ele já não sorria. Estava sério, os olhos diminuídos. Em redor deles, reapareceram as rugazinhas abertas em leque.
- Boa noite, Raquel.
- Chega, Ricardo! Você vai me pagar!... - gritou ela, estendendo os braços por entre as grades, tentando agarrá-lo.- Cretino! Me dá a chave desta porcaria, vamos!- exigiu, examinando a fechadura nova em folha. Examinou em seguida as grades cobertas por uma crosta de ferrugem. Imobilizou-se. Foi erguendo o olhar até a chave que ele balançava pela argola, como um pêndulo. Encarou-o, apertando contra a grade a face sem cor. Esbugalhou os olhos num espasmo e amoleceu o corpo. Foi escorregando.- Não, não...Voltado ainda para ela, ele chegara até a porta e abriu os braços. Foi puxando as duas folhas escancaradas.
- Boa noite, meu anjo.
Os lábios dela se pregavam um ao outro, como se entre eles houvesse cola. Os olhos rodavam pesadamente numa expressão embrutecida.- Não...Guardando a chave no bolso, ele retomou o caminho percorrido. No breve silêncio, o som dos pedregulhos se entrechocando úmidos sob seus sapatos. E, de repente, o grito medonho, inumano:-  NÃO! Durante algum tempo, ele ainda ouviu os gritos que se multiplicaram, semelhantes aos de um animal sendo estraçalhado. Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda.
 
Lygia Fagundes Telles

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Bezerro sem mãe

Estou apaixonado pela simplicidade dos textos de Rachel de Queiróz. Ela não tem linguagem complexa, palavras eruditas, mas consegue captar os verdadeiros sentimentos provindos da simplicidade do sertão nordestino. O conto a seguir, marcado por um tom regionalista característico da escritora, nos fala sobre aquilo que Drummond já anunciara em seus poemas: "O amor foge aos regulamentos vários", e o que sobra no final, é apenas... amor, sem explicação que o sustente; apenas pelo simples fato de amar, não importando quem, etnia, religião ou gênero.
Observe também que a dor pode nos mover para a frente, mesmo quando imaginamos não haver saída para o nosso sofrimento.

                                                           
 Bezerro sem mãe
 
          Foi numa fazenda de gado, no tempo do ano em que as vacas dão cria. Cada vaca toda satisfeita com o seu bezerro. Mas dois deles andavam tristes de dar pena: uma vaca que tinha perdido o seu bezerro e um bezerro que ficou sem mãe.
       A vaquinha até parecia estar chorando, com os peitos cheios de leite, sem filho para mamar. E o bezerro sem mãe gemia, morrendo de fome e abandonado.
        Não adiantava juntar os dois, porque a vaca não aceitava. Ela sentia pelo cheiro que o bezerrinho órfão não era filho dela, e o empurrava para longe.
         Aí o vaqueiro se lembrou do couro do bezerro morto, que estava secado ao sol. Enrolou naquele couro o bezerrinho sem mãe e levou o bichinho disfarçado para junto da vaca sem filho.
         Ora, foi uma beleza! a vaca deu uma lambida no couro, sentiu o cheiro do filho e deixou que o outro mamasse à vontade. E por três dias foi aquela mascarada. Mas no quarto dia, a vaca, de repente, meteu o focinho no couro e puxou fora o disfarce. Lambeu o bezerrinho direto, como se dissesse: “Agora você já está adotado.”
          E ficaram os dois no maior amor, como filho e mãe de verdade.

Rachel de Queiróz
 

Para sempre em nossos corações...

"Vocês me deixavam doidião! Oh, yes"
 

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Um Grande Homem

Não sei ao certo a razão de postar este texto. Talvez porque eu busque em mim este grande homem e me questione sobre sua real existência. Mas desta não devo duvidar, pois conheço algumas pessoas que o encontraram e são felizes ao seu lado. Perfeição não existe, mas sempre existirá o amor, capaz de fazer deste homem, um ser grande, mesmo que os obstáculos permeiem o seu caminho.

"Minha filha, apaixone-se por Um Grande Homem e nunca mais voltará a chorar".
Perguntei-me tantas vezes, qual era a fórmula exata para chegar a ser esse grande homem e não deixar-me vencer pelas coisas pequenas....
Com o passar dos anos, descobri que se tão somente todos nós homens lutássemos por ser grandes de espírito, grandes de alma e grandes de coração, o mundo seria completamente diferente!
Aprendi que um Grande Homem... não é aquele que compra tudo o que deseja, porque muitos de nós compramos com presentes a afeição e o respeito àqueles que nos cercam.
Meu pai lhe dizia:  "Não se apaixone por um homem que só fale de si mesmo, de seus problemas, sem preocupar-se com você... Enamore-se de um homem que se interesse por você , que conheça suas forças, suas ilusões, suas tristezas e que a ajude a superá-las. 
Não creia nas palavras de um homem quando seus atos dizem o oposto.
Afaste de sua vida um homem que não constroi com você um mundo melhor .... Ele jamais sairá do seu lado, pois você é a sua fonte de energia.. 
Foge de um homem enfermo espiritual e emocionalmente, é como um câncer, matará tudo o que há em você (emocional, mental, física, social e economicamente). 
Não dê atenção a um homem que não seja capaz de expressar seus sentimentos, que não se ame saudavelmente.
Não se agarre a um homem que não seja capaz de reconhecer sua beleza interior e exterior e suas qualidades morais. 
Não deixe entrar em sua vida um homem a quem tenha que adivinhar o que quer, porque não é capaz de se expressar abertamente.
Não se enamore de um homem que ao conhecê-la, sua vida tenha se transformado em um problema a resolver e não em algo para desfrutar.
Não creia em um homem que tenha carências afetivas de infância e que trata de preenchê-las com a infidelidade, culpando-a, quando o problema não está em você, e sim nele, porque não sabe o que quer da vida, nem quais são suas prioridades. 
Por que querer um homem que a abandonará se você não for como ele pretendia, ou se já não é mais útil ?
Por que querer um homem que a trocará por um cabelo ou uma cor de pele diferente, ou por uns olhos claros, ou por um corpo mais esbelto?
Por que querer um homem que não saiba admirar a beleza que há em você, a verdadeira beleza, a do coração? 
Quantas vezes me deixei levar pela superficialidade das coisas, deixando de lado aqueles que realmente me ofereciam sua sinceridade e integridade e dando mais importância a quem não valorizava meu esforço? 
Custou-me muito compreender que Grande Homem não é aquele que chega no topo, nem o que tem mais dinheiro, casa, automóvel, nem quem vive rodeado de mulheres, nem muito menos o mais bonito.
Um grande homem, é aquele ser humano transparente, que não se refugia atrás de cortinas de fumaça, é o que abre seu coração sem rejeitar a realidade, é quem admira uma mulher por seus alicerces morais e grandeza interior. 
Um grande homem, é o que caminha de frente, sem baixar os olhos; é aquele que não mente, embora às vezes perca por falar a verdade. E sobretudo, um grande homem é o que sabe chorar sua dor sem fugir dela. 
Um grande homem é o que cai e tem a suficiente força para levantar-se e seguir lutando."
 
Estarei aqui, quando ele aparecer...

Texto cuja autoria dizem ser de Arnaldo Jabor
 

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Semelhante à lua

Meu eu atravessa muitas fases, de alegrias, flores, contentamentos, pensamentos avassaladores, insanos, loucos... ufa! E é essa inconstância que me faz incompleto. À procura de algo que não sei o quê, nem onde perdi. Não sou super-herói, nem tenho fórmulas mágicas para ser feliz, apenas deixo para chorar no travesseiro.  



LUA ADVERSA

Tenho fases, como a lua

Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,

no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia

seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

Cecília Meireles

domingo, 12 de junho de 2011

Perguntas e respostas para um caderno escolar

 
-Qual é a coisa mais antiga do mundo?
-Poderia dizer que é Deus que sempre existiu.
-Qual é a coisa mais bela?
-O instante de inspiração.
-E Deus quando criou o Universo não o fez no momento de sua maior inspiração?
-O Universo sempre existiu. O Cosmos é Deus.
-Qual das coisas é a maior?
-O amor, que é o maior dos mistérios.
-Das coisas qual é a mais constante?
-O medo. Que pena que eu não possa responder: é a esperança.
-Qual é o melhor dos sentimentos?
-O de amar e ao mesmo tempo ser amada, o que parece apenas um lugar-comum mas é uma das minhas verdades.
-Qual é o sentimento mais rápido?
- O sentimento mais rápido, que chega a ser apenas um fulgor, é o instante em que um homem e uma mulher sentem um no outro a promessa de um grande amor.
-Qual é a mais forte das coisas?
-O instinto de ser.
-O que é mais fácil de se fazer?
-Existir, depois que passa o medo.
-Qual é a coisa mais difícil de realizar?
-A própria relativa felicidade que vem do conhecimento de si mesmo.
(Depois as perguntas se tornaram mais complicadas).

( LISPECTOR, Clarice. In: A descoberta do mundo, 1984, 478-9p).
 

Cérebro de pobre funciona pior.

Cérebro de pobre funciona pior do que cérebro  de rico. Ouvi esta afirmação hoje e descobri que ela foi tema de mestrado. Bem, ela nos leva a perceber que ambos não funcionam bem, todavia, o de pobre, funciona pior.
Mas quais seriam as razões para tal? As justificativas começam no início da vida, na alimentação. 
Rico dispõe de mais dinheiro e, por isso, tem como comprar mais frutas, verduras e outros alimentos ricos em nutrientes e fibras. Pobre, consegue, infelizmente, muitas vezes a duras penas, somente o arroz e o feijão. Isso quando tem arroz e feijão no prato dos filhos.
Neurocientistas da Universidade da Califórnia mediram a atividade cerebral de crianças pobres, submetidas a testes de lógica, em comparação com a de crianças ricas. Resultado: a região do córtex pré-frontal, relevante para solução de problemas, funciona pior entre os mais pobres.
Os pesquisadores comentam que o problema não é necessariamente a pobreza, mas a falta de estímulos (livros, brincadeiras, museus, exposições) que as crianças sofrem em suas casas. E, com isso, deixam de desenvolver uma área do cérebro decisiva para que prosperem na escola e, mais tarde, no trabalho. Em suma, fica comprometida a criatividade.
Na fase adulta, isso pode ser explicado devido ao nível de stress e aborrecimentos que as classes sociais supracitadas apresentam.
Pobre tem um maior número de problemas, ocasionando a perda de concentração e, consequentemente, o mau funcionamento do cérebro.
O rico, por sua vez, apresenta talvez os mesmos problemas e preocupações, inclusive financeiros, mas estes, por serem solucionados com dinheiro, possibilita ao rico um cérebro mais desenvolvido e o não esquecimento com frequência de seus deveres cotidianos.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Mutabilidade e Imutabilidade Linguística

Estava assistindo este vídeo, engraçadíssimo, no blog do meu amigo Dhiogo e pensei em um processo linguístico. Assista...


A princípio, o vídeo é muito engraçado, em decorrência do uso da palavra night bruique ( deve ser assim que se escreve), pela moça.
Engraçado também pelo contexto do programa, que a gente já espera barraco e bate-boca.  
No entanto, analisando-o sob uma perspectiva linguística, ciência que estuda os fenômenos da língua, devemos considerar que houve aí um processo de mutabilidade e imutabilidade linguística. 
Neste caso, ocorreu a Mutabilidade de Significante, que é a imagem acústica e visual da palavra, o som. Assim, night bruique remeteu o público a uma associação com a palavra Net Book, e o "erro" na fala da convidada, gerou o riso.
O significante, a forma como se escreve, mudou, mas não alterou o significado etimológico da mesma: um computador. Significado é aquilo que está dicionarizado, é o que a palavra quer dizer, o conceito, o que a mesma nos remete.  Assim, houve imutabilidade de significado, ou seja, o conceito dado à palavra não sofreu variação. Night Bruique continuou remetendo a quem ouve e a quem fala, o computador.  Entretanto, o significante mudou. 
A língua, como uma ciência da comunicação, está sujeita a variações na fala, por meio da linguagem, que é a expressão do pensamento nos mais variados contextos sociais, econômicos e políticos.
Inúmeras palavras que utilizamos hoje para nos comunicarmos, sofreu processos semelhantes ao descrito acima. O você, que utilizamos no tratamento corriqueiro com as pessoas, é originário da palavra vossa mercê, que com o passar do tempo, por um processo de redução, se transformou em vosmecê, depois em você, ocê e agora, já virou cê. Assim, ocorreu neste a Mutabilidade de significante e Imutabilidade de significado.
A imagem acústica e visual que temos da palavra se modificou ( significante), mas o significado não alterou, pois continua a conceituar a terceira pessoa, com quem se fala.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

O amor comeu...

Os Três Mal-Amados

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

João Cabral de Melo Neto

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Cantiga de Amor

Iria publicar um texto de auto-ajuda, mas vamos falar sério por aqui, discutindo um pouco de literatura.
A canção que será mostrada chama-se "Margarida", do grupo Roupa Nova, que eu adoro, e ela apresenta um caratér literário interessante para os professores de literatura e àqueles que se sentem fascinados pelas letras. Ouçam...


Analisando-a sob a perspectiva de uma cantiga (lembram-se do Trovadorismo?) , a mesma pode ser considerada uma Cantiga de Amor.
Primeiro, quem fala na cantiga é o homem. Este é um vassalo, alguém de uma classe inferior à da dama da corte e, por isso chamada de rainha. 
Estes termos também nos remetem, impreterivelmente, a um ambiente cortês, com castelos, reis e princesas. O homem desvenda sua coita, a dor de amar e não ser correspondido; o amor é idealizado, pois a dama é uma mulher casada. 
Esta mulher seria como a Virgem Maria, devido ao seu ideal de pureza e castidade.
Na canção, mas a título de análise para a época (século XII) a consideremos como cantiga, há a presença da dor, do sofrimento psicológico do homem ao ver sua dama rejeitar o amor que ele lhe oferta. 
A dama está em seu castelo, pois não quer ficar com um vassalo, um empregado da corte, pois este não tem tantos recursos quanto o marido daquela. 
A palavra pedra apresenta caráter metafórico, pois representa os desafios ofertados pelo amor à dama, e não o fato de o cavaleiro retirar pedras de um castelo, como haveria de supormos.  A senhora o evita. 
A diferença desta cantiga, com as produzidas na época do Trovadorismo português, é que esta, uma canção moderna, apresenta final feliz ao cavaleiro. 
No entanto, não se esqueça: o sentimento predominante na cantiga é o da rejeição por parte da mulher, e de luta e coragem, por parte do homem.
Quando vocês ouvirem músicas sertanejas, caso ouçam, percebam nas mesmas o sentimento predominante. Na maioria dos casos, é o sentimento visto na cantiga de amor, pois é um amor que fere, machuca e destrói. Mas mesmo assim, o eu-lírico ( voz que fala no poema ou cantiga), sente-se satisfeito em cantar ou exaltar essa dor.

quarta-feira, 1 de junho de 2011


Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido

contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis

tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas

muito mais que lindas,
essas ficarão.

Carlos Drummond de Andrade