Estou apaixonado pela simplicidade dos textos de Rachel de Queiróz. Ela não tem linguagem complexa, palavras eruditas, mas consegue captar os verdadeiros sentimentos provindos da simplicidade do sertão nordestino. O conto a seguir, marcado por um tom regionalista característico da escritora, nos fala sobre aquilo que Drummond já anunciara em seus poemas: "O amor foge aos regulamentos vários", e o que sobra no final, é apenas... amor, sem explicação que o sustente; apenas pelo simples fato de amar, não importando quem, etnia, religião ou gênero.
Observe também que a dor pode nos mover para a frente, mesmo quando imaginamos não haver saída para o nosso sofrimento.
Bezerro sem mãe
Foi numa fazenda de gado, no tempo do ano em que as vacas dão cria. Cada vaca toda satisfeita com o seu bezerro. Mas dois deles andavam tristes de dar pena: uma vaca que tinha perdido o seu bezerro e um bezerro que ficou sem mãe.
A vaquinha até parecia estar chorando, com os peitos cheios de leite, sem filho para mamar. E o bezerro sem mãe gemia, morrendo de fome e abandonado.
Não adiantava juntar os dois, porque a vaca não aceitava. Ela sentia pelo cheiro que o bezerrinho órfão não era filho dela, e o empurrava para longe.
Aí o vaqueiro se lembrou do couro do bezerro morto, que estava secado ao sol. Enrolou naquele couro o bezerrinho sem mãe e levou o bichinho disfarçado para junto da vaca sem filho.
Ora, foi uma beleza! a vaca deu uma lambida no couro, sentiu o cheiro do filho e deixou que o outro mamasse à vontade. E por três dias foi aquela mascarada. Mas no quarto dia, a vaca, de repente, meteu o focinho no couro e puxou fora o disfarce. Lambeu o bezerrinho direto, como se dissesse: “Agora você já está adotado.”
E ficaram os dois no maior amor, como filho e mãe de verdade.
Rachel de Queiróz
Este texto ele é muito enteressante
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